domingo, 8 de fevereiro de 2015

CARACTERIZAÇÃO DO PERSONAGEM 'FABIANO' – VIDAS SECAS (GRACILIANO RAMOS)



        Fabiano é um homem bruto e rude, porém capaz de analisar a si mesmo. Ele tem consciência de que mal sabe falar, mas admira os que sabem se expressar, como por exemplo, Seu Tomás da Bolandeira, seu ex-patrão. Este fragmento deixa bem claro as limitações de Fabiano: "Admirava as palavras compridas e difíceis da gente da cidade, tentava reproduzir algumas, em vão, mas sabia que elas eram inúteis e talvez perigosas” (p. 20).O próprio Fabiano chega à conclusão de que não passa de um bicho. Vejamos o trecho seguinte: “– Você é um bicho, Fabiano” (p. 18). Esta é uma frase de animalização, dita por Fabiano a si próprio, já que ele conseguia sobreviver à seca e se orgulhava disso. Vejamos este outro fragmento para reforçar o que foi dito até aqui: “Isto para ele era motivo de orgulho. Sim senhor, um bicho, capaz de vencer dificuldades” (p. 18). 
         Fabiano é um homem humilhado pela sociedade a que pertence, sendo que ele não consegue fugir de sua condição de animalização imposta pela estrutura social. Talvez seja por isso que Fabiano sente-se um homem inferior diante das outras pessoas. Ele se sente inferior diante de pessoas como Seu Tomás da Bolandeira que possui um status econômico elevado, além de ser um homem extremamente culto. Seu Tomás é sempre referência na vida de Fabiano e de sua família. Por exemplo, Fabiano sempre utiliza palavras difíceis a fim de imitar seu ex-patrão, com o intuito de parecer “sabido”. Este fragmento comprova muito bem isso: “Em horas de maluqueira, Fabiano desejava imitá-lo [seu Tomás da bolandeira]: dizia palavras difíceis, truncando tudo, e convencia-se de que melhorava. Tolice. Via-se perfeitamente que um sujeito como ele não tinha nascido para falar certo” (p. 22). No entanto, nem mesmo sua família consegue entender suas palavras, porém, apenas Sinhá Vitória consegue entendê-lo, aconselhando-o por diversas vezes. Já o Soldado Amarelo representa para Fabiano a força do Governo a qual não se pode vencer. Fabiano, mesmo sendo preso injustamente pelo Soldado Amarelo, não consegue se vingar dele quando teve a chance, simplesmente por respeitar o posto de representante do Governo. Isso fica evidente neste trecho: “Viu apenas que estava ali um inimigo. De repente notou que aquilo era um homem e, coisa mais grave, uma autoridade (grifo meu). Sentiu um choque violento, deteve-se, o braço ficou irresoluto, bambo, inclinando-se para um lado e para outro” (p.100). Diante deste panorama, podemos concluir que não é só a seca que embrutece o retirante sertanejo, mas também as injustiças cometidas pelas autoridades. 
         Fabiano é honesto, e como ele não é um homem instruído, acaba sendo vítima da corrupção. Exemplo disso, é que Sinhá Vitória descobre que o patrão atual “rouba” nas contas do marido. Nota-se que Sinhá Vitória é bem esperta e o próprio Fabiano admite isso em algumas passagens. Vejamos este trecho: “Não se conformou. Devia haver engano. Ele era bruto, sim senhor, via-se perfeitamente que era bruto, mas a mulher tinha miolo” (p. 93). Fabiano é um homem que, apesar de embrutecido, apresenta uma certa resistência a sua condição de animalização e, às vezes, consegue ser capaz de demonstrar sentimentos de humanização. O sentimento de culpa por matar a cachorra Baleia não o deixa. Vejamos este fragmento: "Chegou-se a sua casa, com medo. Ia escurecendo e àquela hora ele sentia sempre uns vagos terrores. Ultimamente vivia esmorecido, mofino, porque as desgraças eram muitas. Precisava consultar Sinhá Vitória, combinar a viagem, livrar-se das arribações, explicar-se, convencer-se de que não praticara uma injustiça matando a cachorra. Necessário abandonar aqueles lugares amaldiçoados. Sinhá Vitória pensaria como ele” (pp. 114-115). 
        Percebe-se que Fabiano, por diversas vezes, tenta enganar-se a si mesmo em seus devaneios. Vejamos o trecho que se segue: “Fabiano contava façanhas. Começava moderadamente, mas excitara-se pouco a pouco e agora via os acontecimentos com exagero e otimismo, estava convencido de que praticara feitos notáveis. Necessitava esta convicção” (p. 66). No entanto, as aspirações de Fabiano são sempre frustradas pela sua triste condição diante da miséria e das injustiças que o cercam. O fantasma da seca sempre assombra o espírito de Fabiano. A inquietação é constante. Podemos verificar isso no seguinte trecho: “(...) e Fabiano senti-a [a seca] de longe. Senti-a como se ela já tivesse chegado, experimentava adiantadamente a fome, a sede, as fadigas imensas das retiradas” (p.112). Mesmo assim, Fabiano não consegue abandonar seus sonhos e desejos mais íntimos, assim como sua mulher, Sinhá Vitória. Apesar de Fabiano não conseguir se expressar da forma com ele almeja, ele tenta exteriorizar seus sentimentos e anseios, porém se decepciona por não ser capaz de ser compreendido, e, também, de não poder fazer nada para mudar sua triste realidade. Apenas Sinhá Vitória consegue compreender seus anseios, o que acaba sendo um conforto para ele. Fabiano tem consciência de sua limitação e teme ir além por ser totalmente dependente de seu patrão. O trecho seguinte retrata bem as razões que impedem Fabiano de ir além de sua pretensão: “(...) Mas receava ser expulso da fazenda. E rendia-se. (...) era bom pensar no futuro, criar juízo” (p.92). 
       Fabiano julga-se um cabra que serve apenas para cuidar das coisas dos outros. Podemos constatar com este trecho: “(...) E, pensando bem, ele não era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. (...); mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra” (p. 18). Por isso, não consegue pensar diferente, apesar dos anseios, por possuir um sentimento de inferioridade. Esse trecho deixa claro o que foi dito anteriormente: “Comparando-se aos tipos da cidade, Fabiano reconhecia-se inferior” (p.76).
    Fabiano sempre questiona sua condição miserável e tenta encontrar uma explicação para sua desgraça. O fragmento seguinte nos dá uma idéia disso: “(...) Por que não haveriam de ser gente, possuir uma cama igual à de seu Tomás da bolandeira? (...) Por que haveriam de ser sempre desgraçados, fugindo no mato como bichos? Com certeza existiam no mundo coisas extraordinárias. Podiam viver escondidos, como bichos?” (p.121). Para reforçar, vamos acompanhar outra passagem que mostra Fabiano questionando as coisas ruins que acontecem com ele: “(...) Passar a vida inteira assim no toco, entregando o que era dele de mão beijada! Estava direito aquilo? Trabalhar como negro e nunca arranjar carta de alforria!” (p.93).  
         Para finalizar, podemos dizer que Fabiano e sua família vivem um misto de sonho, frustração e descrença. Este fragmento retrata de forma fantástica a afirmação anterior: "E andavam para o sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande, cheia de pessoas fortes. Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias. Eles dois velhinhos, acabando-se como uns cachorros, inúteis, acabando-se como Baleia. Que iriam fazer? Retardaram-se, temerosos. Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada, ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, sinhá Vitória e os dois meninos” (p. 126).
           


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA


RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. Posfácio de Álvaro Lins, ilustrações de Aldemir Martins – 93ª Edição – Rio, São Paulo: Record, 2004.


Por Max Moreira

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